domingo, 6 de fevereiro de 2011

O CHORO DA VIRADA

Talvez na infância fosse diferente, não lembro agora. Só sei que, até onde vai a minha memória, não me recordo de nenhuma meia-noite de réveillon em que eu não tenha me acabado de chorar.

Não existe um motivo específico nem uma dor absurda. A verdade é que tento segurar as lágrimas o máximo que posso, afinal, é até pecado chorar numa situação tão vantajosa. Veja bem, apesar de morar em um país que elege um presidente por causa de uns trocados para amenizar a situação miserável, nunca passei fome, nunca passei frio, nunca me faltou acesso à educação e à cultura, nunca fiquei desempregada e nunca tive nenhum parente ou amigo próximo vítima de alguma violência significativa. Minha vida é boa, muito boa. Então, por que raios choro tanto?

Talvez seja justamente essa constatação: de que sou uma exceção. Talvez eu chore a dor dos outros, a fome dos outros, o frio dos outros, a estupidez dos outros, o presidente e os ladrões de todos. Mas será mesmo que eu penso em tudo isso na praia da moda? Com o vestidinho da moda, o champanhe da moda e a companhia do momento? Grandes chances de eu chorar minha futilidade.

Outra opção seria a saudade que sinto dos entes queridos que já se foram. Mas “entes queridos que já se foram” é uma frase muito brega, não é? Vovô e vovó fazem falta, sem dúvida nenhuma, mas todo netinho cresce sabendo que, se tudo der certo, eles serão os primeiros a partir. Portanto, não considero tais perdas nenhuma dor absurda ou motivo de inconformismo. Tenho mãe, pai, cachorro, amigos, emprego, saúde, paquerinhas, dinheiro. Por que o rio de lágrimas?

MEDO DO FIM?
Tá, este ano talvez eu tenha um bom motivo pra tentar borrar o rímel à prova d’água: perdi um grande amor, talvez o maior deles até hoje. Com certeza o maior deles. Mas quem nunca sofreu desse mal? Tenho até que agradecer ao dito-cujo, sofrer por amor é o grande presente que uma alma arrogante pode ganhar.

Começo 2007 muito mais humana, inteira, madura e... realista.

Será que é isso? Choro a perda da infância e da pureza? Choro a saudade da adolescência, quando eu ainda acreditava que tudo sairia exatamente como eu imaginava? Será que é a constatação de que a cada ano perco mais um ano? Será que é o medo da morte? O medo do meu fim, do fim dos meus pais, do fim dos meus amigos, do fim da minha cachorra, do fim dos meus amores? Será, afinal, que choro a certeza de que nada é eterno?

Ou será que a coisa não chega nessa profundidade toda e choro apenas a drenagem e a musculação que não deram certo, e eu continuo sem o corpo dos meus sonhos? Choro a falta que me faz mais dinheiro, mais amigos, mais amores, mais conquistas, mais viagens, mais, mais, mais, mais. Grandes chances de eu chorar a falta de mais espiritualidade.

Quer saber? Choro por tudo isso e por nada disso. Choro pela minha bunda caída e pela fome do mundo. Choro pelo meu cabelo desajeitado e pelas crianças descalças pedindo esmolas. Choro porque chorei de emoção quando o Lula ganhou pela primeira vez e de raiva quando ganhou pela segunda. Choro de saudade do meu amor e de esperança de encontrar o próximo, certamente muito melhor. Choro pela minha intensidade do tamanho do mundo e pela minha superficialidade que quase não cabe em mim. Choro de medo de morrer e de alegria por estar viva. Choro de saudade da minha criança que não chorava tanto e, sobretudo, de curiosidade pela minha mulher que um dia vai conseguir ser mais feliz. Choro porque sou a pessoa mais sozinha do mundo e, ao mesmo tempo, só mais uma, em meio a tantos, que chora só porque é lindo começar tudo de novo. Feliz 2007 pra vocês.

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