quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Bodinho preto

A verdade é que não estou nem aí pra nenhum de vocês. Eu só preciso dar cara para a minha dor. Eu só preciso abraçar o gigante bode preto que é e sempre foi o meu melhor amigo.
Preciso mais uma vez coçar a coceira, furar a ferida, esguichar o pus. Por alguma razão bizarra, sou viciada nessa merda toda.
Logo depois que você divide o corredor comigo. Você e o ser para o qual não vou dar apelidos porque parei com isso, eu me jogo no chão de tanta dor. Lembrando como era lindo dividir nossas músicas que sempre viravam hits para nossas impossibilidades. E como era lindo iluminar o escuro dos esconderijos com os seus olhos. E então te amo de novo, infinitamente, quase sem ar.
E depois isso passa. Depois te esqueço. Como já esqueci tantas vezes. E você não é mais ninguém como de fato já não é há muito tempo.
Mas preciso de mais. E então me recordo mais uma vez dele e seu sorriso congelado. Nenhuma pedra minha sequer arranhou sua pintura perfeita. A imagem é sempre dele indo embora com a roupa cheirosa, o topete impecável, os dentes fortes e a vida ajeitada. E de eu ficando pra trás rasgada, suja, cuspindo sangue e sentindo uma falta absurda de alguns motivos para viver que ele roubou para se abastecer.
E lembro que todo mundo quase quer me contar alguma coisa sobre ele. E eu não deixo nada chegar achando que com isso me protejo. Mas na verdade é para manter a curiosidade e doer ainda mais. Para eu poder imaginar tantas coisas piores do que poderiam ser a realidade. E mais uma vez deixar doer, doer, doer. E abraçar o bodinho preto. Meu brother. Bodinho preto velho de guerra.
Mas isso também passa. Afinal, minha mais recente descoberta é que já posso me esquecer por novos assuntos. Genial. E então me lembro do cabelo que pode ser tantas coisas e não é nenhuma. Pode ser liso ou cacheado. Pode ser castanho ou preto. Pode ser armado ou careta. É o cabelo mais lindo do mundo. Daqueles pra enfiar os dedos e comandar a vida. E depois ver a vida escorrer pelos dedos.
Decorei seus três tipos de sorriso de tanto entrar no seu site e te ver na tv e sonhar com você. Em todas as minhas telas só passa você. O com os olhos escancarados que te deixa com cara de bobo, o de menino que te deixa com cara de só mais um menino e o de orgulhoso, que te deixa com cara da pessoa que pode me magoar.
E isso dói, dói, dói. Vem bodinho preto, abraça eu, isso. Vem e me leva cavalgar pelo inferno. Delícia.
E isso também passa. E em minutos seu cabelo já não tem mais importância nenhuma. Já nem lembro que você existe e prefiro ver o último capítulo da novela. Mas eu preciso de mais. E então volto a dividir o corredor com você e o ser para o qual não vou dar nomes porque não faço mais isso. E depois tento jogar pedras na pintura e ele vai embora de novo sorrindo. E enfio em pensamento meus dedos pelos seus cachos.
E todos são a mesma pessoa. Pessoas que não são ninguém. Que nunca existiram a não ser aqui, entre essas linhas. Só quem existe é ele. O imutável companheiro de uma vida inteira. Sim, o bodinho preto. O bodinho que me trouxe até aqui e agora eu tenho um medo danado de seguir em frente sem ele.
Ser feliz é a coisa mais aterrorizante do mundo.

2 comentários:

  1. E então te amo de novo, infinitamente, quase sem ar.
    E depois isso passa. Depois te esqueço. Como já esqueci tantas vezes. E você não é mais ninguém como de fato já não é há muito tempo.


    adoro esse trecho. Tati, musa.

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  2. Cara Tati. Me identifiquei com você sobre a meiguice. Durante alguns anos fui cobrada para ser meiga e calma. Mas sempre fui pavio curto. Hoje, aos 60 anos, vejo que melhorei muito em relação a ser mais calma, mais sensata, não impulsiva ao extremo. Isso se deve a um remedinho milagroso (Paxil - cloridrato de paroxicetina) e a muita coisa que aprendi com a experiência em todos os ambientes: trabalho, família, filhos, social, acadêmico.E, como reclamava muito com meu ex-marido, motivo maior de nossa separação, informei-me que os homens, de modo geral, só entendem que necessitamos da ajuda deles se a pedirmos. Eles não têm a nossa sensibilidade para entender os fatos e resolvê-los sem que nos peçam.
    Gostei muito do seu livro "Depois a louca sou eu". Espero que você possa viver sem remédios, mas se isso não for possível, não se estresse. Para mim, qualquer remédio que nos ajude pode ser tomado a vida inteira. Um grande abraço, Maria do Rosário Andrade Chaves - Belo Horizonte (Rô Andrade no facebook).

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